segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

DONA LAURA


O telefone, cruel, começa a fazer seu ruído na cozinha: é minha mãe, com notícias nada boas de Antonina: faleceu Laura Veiga de Camargo, Dona Laura, a boa, bela e doce Dona Laura não está mais entre nós. Consta que faleceu serena, como serena viveu. Impossível não chorar neste momento triste.
No entanto, ora bolas, somos egoístas: choramos pela sua perda, mas choramos por nós e pela nossa perda. Dona Laura, pessoa boa e bela, viveu a vida com prazer e intensidade, sempre fiel às coisas em que acreditava. Para onde foi, foi com certeza em paz. Se existe vida após a morte, com certeza ela estará no céu, ao lugar destinado às pessoas boas. Se não existe – dessas coisas nada sabemos – fica o seu exemplo e a lembrança de sua vida boa e digna. Para nós, que continuamos na toada da vida, temos que honrar, respeitar e lembrar seu nome e seu exemplo.
Para todos, Dona Laura dava sempre um sorriso, um carinho, uma palavra de apoio. Lembro-me especialmente de um dia em que, no primeiro ano primário, tive um ataque de choro e queria ir pra casa. Ainda não estava acostumado com a vida de escola. Dona Laura me acalmou, me levou pra fora, tranqüilizou-me e me deixou desenhar com os pincéis atômicos numa folha de papel que ela me entregara. “Sabia que os astronautas na lua escrevem com ele?” me disse, com carinho. Era o tempo das viagens espaciais e da Apolo 11, e eu era vidrado no mundo da Lua (ainda sou, confesso!!). Com a conversa de Dona Laura, me tranqüilizei e voltei pra minha sala. E continuo até hoje entre os muros da escola.
Lembro-me com carinho de sua casa e do seu quintal cheio de goiabeiras que tão generosamente compartilhamos na infância, os meninos da minha rua. Lá, montamos os circos que Rafael fazia, víamos e participávamos dos espetáculos circenses. No carnaval saímos acompanhando o boi de Rafael, sempre sob o olhar carinhoso de dona Laura vendo aquela piazada entrar e sair de sua casa, feliz e generosa como ela só sabia ser.
Cheguei a freqüentar – pouco, menos do que deveria – sua casa de Curitiba, casa cheia de gente boa, agora a casa de Geraldo Leão, de Rafael, onde conheci e curti muitos artistas da cena curitibana. Como a casa de infância, continuava sendo uma casa generosa, onde todos entravam e saiam felizes, onde se viam pelas paredes quadros de Geraldinho e ouvíamos a musica de Rafael, sob o olhar feliz de dona Laura.
Mais recentemente, conheci a dona Laura dos belos e singelos textos, alguns publicados pela prefeitura nos anos 90. Outros textos, conheci pela rede mesmo, como o belíssimo texto dos “Sons de Antonina” que postarei logo a seguir. Contavam histórias belas, histórias engraçadas, historias cheias de emoção, como a das brincadeiras de Seu Geraldo Leão, seu marido, das historias dos caranguejos com velas nas costas assombrando as crianças como almas penadas, historias do cotidiano da cidade: a chegada do navio, do trem, os sons das pessoas trabalhando e vivendo. Tudo isso tomava um ar de saudade e melancolia, mas com uma leveza e uma alegria que só ela, dona Laura, poderia proporcionar.
Estive há pouco com ela, acho que no inicio do ano: veio nos visitar em casa de minha mãe, e, na volta, a deixei em sua casa antes de subir a Serra pra Curitiba. Conversamos sobre diversas coisas, rimos muito, saímos felizes de sua casa, a pequena casinha no Buraco da Onça, casa boa e generosa como as casas que conheci na infância e na adolescência.
Ao lembrar dela, aqui de longe, lembro de seu sorriso, de sua risada galhofeira, da ternura de suas palavras, da maneira com que se dirigia a nós, sempre pelos diminutivos: sempre me chamou de “jeffinho”, assim, com carinho, embora tenha virado esse grandalhão feioso que hoje sou. Com ela do meu lado contando histórias em casa de minha mãe, me senti pequeno e magrinho, com vontade de tomar dolé de maracujá no bar ao lado de sua casa, ali do lado da casa de minha avó. Dona Laura, que falta a senhora nos faz!
(meus pêsames a toda sua família, de quem tanto gosto)

3 comentários:

  1. Me bateu uma enorme saudade do tempo do circo no quintal da Tia Laura...

    ...lembro-me do amigo Claudinho (hoje na estiva), pulando do pé de goiabeira, lá do alto, era a última atração do circo... só o Rafa para fazer uma coisa dessa mesmo... rsss

    ...Tia Laura, tia Tite, amigas e cumplices de mamãe... Lindas, assim como todas as belas mulheres antoninense são...

    ...é uma pena que um pouco das nossas referências estão indo para um outro plano... são traços do destino, é a única certeza plena...

    ...assim como o meu amigo Jeffinho..., me compadeço pela passagem da Tia Laura.

    Neuton Pires

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  2. belo texto, Jeff.
    Adorava dona Laura. Fiquei devendo muitos cafés pra ela

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  3. puxa, gente, que privilegio foi termos nós todos convivido com um ser humano como ela, não?

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